Rui Prediger, coordenador do estudo no âmbito da UFSC.
“A outra grande novidade do nosso desenho é essa avaliação de longo prazo. Por várias dificuldades, tanto de recursos, como de manter os pacientes aderindo a um estudo de longo prazo, a grande maioria dos ensaios é avaliado por no máximo seis meses. Um período curto. O nosso trabalho vai avaliar esses efeitos dos canabinoides por três anos. Então esse também é um diferencial, porque sabemos que às vezes um tratamento pode ser eficaz no início, mas o benefício não se manter a longo prazo. De fato, a gente não tem um estudo ainda avaliando isso, se a longo prazo esses canabinoides são eficazes para o Parkinson e o Alzheimer”, complementa o pesquisador.
A iniciativa é uma parceria entre o Laboratório Experimental de Doenças Neurodegenerativas (Lexdon) da UFSC, coordenado por Rui, e o Laboratório de Cannabis Medicinal e Ciência Psicodélica (LCP) da Unila, coordenado pelo professor Francisney Pinto do Nascimento em Foz do Iguaçu. Além dos pesquisadores dos dois laboratórios, participa do estudo a professora do Centro Universitário para o Desenvolvimento do Alto Vale de Itajaí (Unidavi) Samantha Cristiane Lopes, que coordena o projeto de extensão Flor&Ser com pacientes de Parkinson em Rio do Sul. O trabalho faz parte das teses de doutorado de Ana Carolina Ruver Martins e Taynara da Silva, que pesquisam Parkinson e Alzheimer, respectivamente, no Programa de Pós-Graduação em Farmacologia da UFSC.
Vale ressaltar que todos os pacientes continuam sendo acompanhados por seus médicos e utilizando as medicações receitadas. A interação dos canabinoides com os medicamentos, aliás, também é objeto de estudo dos pesquisadores. “É importante deixar claro que esse indivíduo não para o seu tratamento. Isso, do ponto de vista ético, é super importante. Ele segue com o seu tratamento normal, e o canabinoide entra como adjuvante. Ele vai ser usado para auxiliar o tratamento”, enfatiza Rui.
Somente depois de seis meses, será revelado em que grupo estava cada paciente, e os cientistas começarão de fato a analisar os dados. Inicia-se, então, uma nova fase do estudo, em que todos os pacientes, incluindo os que estavam no grupo placebo, poderão ter acesso ao tratamento com os canabinoides, se assim desejarem. Todos seguirão sendo monitorados, com testes e exames a cada seis meses, até o final do estudo.
Cientistas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila) conduzem os maiores ensaios clínicos do mundo para avaliar como o uso de substâncias extraídas da Cannabis sativa, a planta da maconha, podem colaborar para o tratamento das doenças de Parkinson e Alzheimer. No total, 140 pacientes participarão dos dois estudos – 70 com cada doença. Os testes devem durar cerca de três anos e envolvem pesquisadores de três instituições e avaliações em Florianópolis (SC), Rio do Sul (SC) e Foz do Iguaçu (PR).
O pioneirismo dos estudos está justamente no prazo de duração e no número de participantes. “Normalmente os estudos clínicos são feitos com um número pequeno de pacientes. Os realizados até agora com canabinoides e Parkinson e Alzheimer estão na faixa de 15 a 20 pacientes”, comenta o professor Como vai funcionar
Os pacientes com Parkinson receberam seus primeiros kits com canabinoides e passaram pelas primeiras avaliações, em Florianópolis e Rio do Sul, em janeiro, já os estudos com Alzheimer estão previstos para começar em março e ocorrerão em Foz do Iguaçu. As duas pesquisas contarão com metodologias semelhantes. Durante os primeiros seis meses, metade dos pacientes com cada doença receberá um composto que combina duas substâncias extraídas da planta da maconha: o canabidiol (CBD) e o tetrahidrocanabinol (THC). A outra metade receberá um placebo – uma substância sem qualquer efeito terapêutico. Nem pacientes, nem cientistas sabem quem está recebendo o quê. Os pacientes passam por avaliações periódicas. São analisados diversos parâmetros, incluindo os tremores e questões relacionadas à movimentação, nos pacientes de Parkinson, e à memória, nos de Alzheimer. São observados, ainda, sintomas de ansiedade, depressão e qualidade do sono, entre outros. Os pacientes também são atendidos por neurologista nesses encontros e realizam exames de sangue para avaliação de indicadores de progressão das doenças.Dificuldades para importação e papel da Universidade
Se, por um lado, os pesquisadores não tiveram problemas em encontrar pacientes interessados – foram cerca de 130 pessoas com Parkinson inscritas para as 70 vagas –, por outro, a obtenção dos canabinoides para uso na pesquisa envolveu muitos entraves burocráticos e exigiu um trabalho árduo da equipe de pesquisadores. Foram dois anos para conseguir importar o produto. “O que atrasou bastante o início dos estudos foi a aprovação pela Anvisa”, salienta Rui. “Embora canabinoides sejam de um grande uso popular, são substâncias que ainda têm o uso, o consumo e mesmo o porte muito controlados. Então essa é a principal dificuldade. Tem uma série de ritos ali dentro do processo de importação que têm que ser respeitados”, complementa. Esse foi o maior lote de canabinoides já importado para pesquisas no Brasil, e, segundo o professor, o suporte da Universidade foi essencial para o sucesso do processo. “Vale a pena destacar muito o trabalho dedicado do setor de importação aqui da UFSC. Eles foram fantásticos”, reforça. “A UFSC tem um histórico de pesquisa com canabinoides fantástico”, adiciona. Ele cita alguns exemplos pioneiros de trabalhos com a cannabis, como os do professor aposentado do Departamento de Farmacologia Reinaldo Takahashi, que começou suas pesquisas com canabinoides há mais de 40 anos e, segundo Rui, é um dos grandes pioneiros do Brasil na área. Destaca, também, os estudos com cannabis para uso veterinário no Campus de Curitibanos, conduzidos pelo professor Erik Amazonas, primeiro cientista brasileiro a conseguir na justiça autorização para plantio, preparo, produção, depósito e porte da cannabis para pesquisas.Recrutamento de pacientes
Todos os pacientes com Parkinson já foram selecionados, mas os pesquisadores ainda estão recrutando pessoas com Alzheimer para participar do estudo em Foz do Iguaçu. Podem participar idosos com mais de 60 anos, que tenham o diagnóstico de Doença de Alzheimer há menos de oito anos e com disponibilidade de estar em Foz do Iguaçu uma vez por mês ao longo de seis meses. A participação é gratuita. Os interessados podem entrar em contato pelo Whatsapp +55 45 99156-6582 ou pelo e-mail [email protected].Opnião: Fale com a gente, "o que, você quer ler no Portal, deixe sua opinião AQUI
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